Nem fariseus nem saduceus

sexta-feira, 17 de abril de 2015


António Costa renunciou ao cargo de presidente da Câmara de Lisboa, dizendo sentir "em consciência" que se deve concentrar em "servir Portugal e os portugueses". Já Fernando Medina, entronizado em substituição, aproveitou a ocasião para apresentar um novo programa para o governo da cidade, confessando que o município tem o "dever de fazer mais e fazer melhor".

A ambição será legítima. Mas tem o significado político de Fernando Medina assumir tranquilamente que antes de si e enquanto presidente, Antonio Costa fez menos e fez pior.

Saberá do que fala, no testemunho privilegiado de quem foi braço-direito. Contudo, não poderia ter nisso pretexto para substituir um programa que os lisboetas sufragaram, por outro de sua predileção, mas que nunca foi a votos.

Fernando Medina recordará que não foi candidato ao cargo que agora exerce. António Costa, sim. Foi e venceu. Pena não ter assumido em causa própria as consequências que exigiu a outros, nas exatas circunstâncias que o destino quis repetir.

Quando Santana Lopes substituiu Durão Barroso como primeiro-ministro, António Costa protestou. E entrevistado em 2004 na "Acção Socialista", com Augusto Santos Silva a diretor, disse a propósito: "(...) Há uma coisa que é clara: temos hoje um líder da oposição eleito diretamente pelos militantes no congresso e temos um líder de Governo que não foi eleito nem por militantes, nem por eleitores (...). Isto, do ponto de vista da legitimidade política, faz toda a diferença e ela é incontornável (...)".

Diz tudo. De qualquer modo, se António Costa se propuser agora "servir Portugal e os portugueses", como serviu a capital e os lisboetas, estaremos todos mal.

Bastará ter presente que nas autárquicas de 2013 pediu confiança. E teve-a. Mas depois foi como se viu. O mandato que conquistou, na base de um programa que não cumpriu, apesar de selado nas urnas, durou pouco mais de um ano, passado fora, em campanhas para outras lides.

Não menos surreal, diga-se, Marinho e Pinto denunciou esta semana a "silenciosa cumplicidade dos fariseus do sistema político", sobre o abandono de Costa, relativamente ao "mandato que pedira e recebera".

Logo Marinho e Pinto, que uma semana depois da tomada de posse no Parlamento Europeu, para um mandato em que prometera ser a "formiguinha" que faria toda a diferença, anunciou que renunciará ao cargo, se for eleito deputado à Assembleia da República nas próximas legislativas.

Nesta matéria, verdade seja dita, entre um e outro, nenhuma diferença. E por isso que ninguém cale. Nem fariseus nem saduceus.

Retirado de http://www.jn.pt/opiniao/default.aspx?content_id=4513393

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